A lusofonia une Portugal, Angola e Brasil em um conjunto de
países que se expressam pela língua portuguesa. Mas o escritor angolano
Pepetela desconfia de que essa comunhão se verifique na prática. “Eu não sei se
existe mesmo uma comunidade”, diz. Autor de Mayombe, Peptela se detém sobre
esses pontos de contato entre os países lusófonos no episódio Do Outro Lado do
Mar, que integra a segunda temporada da série Super Libris, dirigida pelo
escritor, cineasta e jornalista José Roberto Torero, e será exibido pelo SescTV
nesta segunda-feira (21/05), às 21h.
Pepetela nasceu na cidade de Benguela, na Angola, em 1941. Na
década de 60, depois de iniciar os cursos de Engenharia e Letras, integrou o
MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), uma das várias frentes que
lutavam pela independência da então colônia de Portugal. Durante a Guerra de
Libertação (1961-1974), o guerrilheiro habituou-se a combater de dia e escrever
à noite. No episódio, ele conta que, ao terminar, enrolava o manuscrito em um
plástico, para protegê-lo da chuva, e o enfiava no buraco de uma árvore, para
tomá-lo de volta dias depois, quando regressasse à base da frente. “Eu tentava
perceber o sentido de tudo aquilo que estávamos fazendo, eu procurava o sentido
da história”, conta o autor.
Foi nestas condições que surgiu “Mayombe”, um dos mais
importantes romances angolanos da história. Publicado em 1980 e até hoje o
único texto literário sobre a resistência angolana, o livro popularizou-se no
Brasil a partir de 2017, quando se tornou leitura obrigatória para o vestibular
da Fuvest, em São Paulo.
Segundo o autor, o interesse pela obra no Brasil deve-se aos
vários pontos de contato que Angola estabelece com nosso país. Além da auto
ironia e da preocupação com a realidade social, opina o autor, “outra coisa em
comum é a maneira de usar a língua. É essa falta de respeito que temos com a
língua portuguesa, torturando-a, agredindo-a”, brinca.
Pepetela ainda observa que o baixo número de autores
angolanos publicados no Brasil é um reflexo da preferência do país por outras
culturas. “O Brasil está muito virado para o Norte. Antes era para França, hoje
é para os Estados Unidos”, critica. Aqui no Brasil, além dele, são mais
conhecidos nomes como Ondjaki, Agualusa e Luandino. “Da nossa geração, existem
outros escritores, de qualidade, só que não foram publicados fora”, explica.
Porém, ele enxerga a possibilidade de uma mudança. “Há novas
gerações. E elas são mais agressivas do ponto de vista da afirmação. Então
talvez essas gerações consigam romper a barreira das fronteiras”, vislumbra,
otimista, o autor angolano.
Além da entrevista principal, Pepetela participa de outros
quadros no episódio Do Outro Lado do Mar. Em Pé de Página, ele revela o lugar
onde escreve, como se organiza e por quê decidiu escrever. No Primeira
Impressão, sugere a leitura do livro Viva o Povo Brasileiro, do baiano João
Ubaldo Ribeiro, de quem ele era amigo.
Ainda no episódio, o quadro Orelhas apresenta o escritor
moçambicano Mia Couto; na seção Prefácio, Cristiane Tavares continua detida na
obra de Couto, mas desta vez examina um de seus livros infantis, O gato e o
Escuro. No quadro Quarta Capa, o booktuber Danilo Leonardi opina sobre o livro A
Desumanização, do português Valter Hugo Mãe. Em Epígrafe, quadro novo desta
segunda temporada, Sabina Anzuategui, roteirista do filme Desmundo, adaptado do
livro de Ana Miranda, fala sobre como ela adaptou a linguagem textual para a
projeção cinematográfica.